sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Igreja Protestante Nazista Vive Dilema Histórico

Igreja Memorial Martinho Lutero

ALEMANHA - O Terceiro Reich caiu em 1945, mas quem entra na Igreja Memorial Martinho Lutero pode achar que voltou no tempo.
Este é o último templo nazista da Alemanha, cujo interior é decorado  com símbolos de exaltação a Adolf Hitler e à supremacia ariana.
Até 2005, ainda era usado para cultos protestantes, mas foi fechado depois que um pedaço da fachada desabou.
Desde então, a Paróquia luterana de Tempelhof está mobilizada para arrecadar fundos para a reforma de toda a estrutura.
Para Isolde Bohm, decana da paróquia, este é um esforço que vale a pena:
O prédio vai continuar servindo de alerta às futuras gerações, uma forma de lembrar como a sociedade e a Igreja Protestante se alinharam com os nazistas nos anos 30.

Na Martinho Lutero, símbolos sacros misturam-se aos políticos, um sinal claro do quanto o Movimento Cristão Alemão (DC, sigla em alemão= Deutsche Christen) foi poderoso no regime de Hitler.


Ao historiador Stephan Linck, que investigou a culpa admitida pelos luteranos em relação a Hitler, foi perguntado se os escritos de Lutero contra os judeus tiveram um papel na “sintonia” com o antissemitismo nazista. – Respondeu o historiador – as profundas raízes do antissemitismo da Igreja Evangélica afundavam no nacionalismo alemão; no entanto, sim, muitos protestantes se referiam aos escritos de Lutero contra os judeus para demonstrar que eles eram os ANTISSEMITAS ORIGINAIS: no fundo, Lutero já havia incitado a perseguir os judeus e a incendiar as sinagogas.

Os escritores Dennis Prager e Joseph Telushkin revelam:

“[...] os escritos posteriores de Lutero, atacando os judeus, eram tão virulentos que os nazistas os citavam freqüentemente. De fato, Julius Streicher (nazista), argumentou durante sua defesa no julgamento de Nuremberg que nunca havia dito nada sobre os judeus que Martim Lutero não tivesse dito 400 anos antes”. (Dennis Prager e Joseph Telushkin: Why the Jews? The reason for anti-Semitism [Por que os Judeus: A causa do anti-semitismo] (Nova York: Simon & Shuster, 1983), p. 107.)


Paradas dos Deutsche Christen (protestantes nazistas)

Bandeira dos nazi protestantes

Marcha dos Deutsche Christen

Paramilitares da SA nazista com cartazes dos”DeutscheChristen”,
Julho 1933 – Berlim

Em agosto de 1932, a Igreja católica excomungou todos os dirigentes do Partido Nazista. Entre os princípios anticristãos denunciados como hereges, a Igreja mencionava explicitamente as teorias raciais e o racismo.

Também em agosto de 1932, a Conferência Episcopal Católica Alemã publicou um documento detalhado em que se davam instruções de como se relacionar com o Partido Nazista. No documento, publicado pela Conferência Episcopal Alemã, está escrito que era absolutamente proibido aos católicos ser membros do Partido Nacional-Socialista. Quem desobedecesse seria imediatamente excomungado.
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/noticias-arquivadas/26283-os-nazistas-foram-excomungados-por-bispos-alemaes

Em 14 de julho de 1933, o governo de Hitler aprova uma nova Carta para a Igreja Protestante.
Com a intervenção maciça do NSDAP (partido nazista)as eleições nas igrejas protestantes agendadas apenas em curto período de tempo mais tarde resultam em uma retumbante vitória para os “cristãos alemães” (leia-se protestantes nazistas).
Hitler apela a todos os cristãos protestantes, em um discurso de rádio na véspera da eleição para votar a favor dos “cristãos alemães”, com seu slogan: ”Igreja deve continuar a ser da Igreja.”

Assembléia dos “Deutsche Christen”, em 13 de
Novembro de 1933 – Berlim

Como se observa, na união das Igrejas protestantes com o Estado nazista, os “cristãos alemães” desejavam alcançar absoluta conformidade organizacional e ideológica entre as Igreja Protestantes e o Estado Nacional Socialista.
Após seu sucesso triunfal nas eleições das Igrejas protestantes, em Julho de 1933 e a eleição do luterano Ludwig Muller para o cargo de Bispo do Reich, eles sentiram que tinham atingido o auge de seu poder sobre a política da igreja no Outono (europeu) de 1933.


O Bispo, luterano, Ludwig Muller, saudando os protestantes nazistas

Reunião dos protestantes alemães. Na faixa, os dizeres:
“Os cristãos alemães leem o Evangelho no III Reich.”

O Bispo luterano de Dresden, Friedrich Coch, é um dos principais líderes dos “Deutsche Christen” na Saxônia. Era consultor do NSDAP (partido nazista) para assuntos da Igreja  desde 1932, foi eleito para o cargo de Bispo do estado 
no ” Sínodo Marrom “, em Agosto de 1933.


Foto da época – Catedral Evangélica Luterana 
Landeskirche, em Brunswick



A figura de Jesus talhada em madeira no púlpito, tem feições arianas,
no rosto, não há expressão de sofrimento, mas de vitória.

O Púlpito, mostra Jesus, um soldado nazista e uma família ariana, numa representação do Sermão da Montanha. Em vez dos apóstolos, quem acompanha Jesus são homens do temido esquadrão de defesa Schutzstaffel (SS)


Pia batismal com Jesus, um soldado, ladeado, por 2 querunbins). A porta é guardada por
um soldado da tropa de assalto SA. (Sturmabeitlung) Outros soldados com o tradicional 
capacete da milícia, aparecem em todas as paredes do templo.
  

Painel com símbolos cristãos, águia e soldados nazistas

- Os membros da DC queriam uma forma de cristandade que fosse explicitamente anti-judaica e se adequasse à necessidade de uma nação ``masculina``, poderosa - explica a historiadora Doris Bergen, especializada em nazismo, - Muitos deles tinham dinheiro e posições de poder no governo, em universidades. Logo, financiavam a decoração da igreja, a publicação de livros e outras maneiras de divulgar suas idéias.

Sobre a mesa, Friedrich Wieneke, pastor protestante dos "Cristãos Alemães", em Soldin, falando à Liga de Luta Estudantil dos "cristãos alemães" (nazistas) no verão de Julho de 1933. Frase célebre do pastor Friedrich Wieneke : "A paz só virá quando o último judeu se enforcar no último intestino do último vigário". - Fonte: Report from Wieneke, “attacks on Pastors”, dated 9,1941 – (BA Koblens R 43 11/478ª, fiche 1, document 19).

Como se vê nas palavras do pastor Wieneke, além dos judeus, a Igreja Católica também era uma coisa a ser varrida da Alemanha.

Dennis Prager e Joseph Telushkin afirmam:

“Ao executarem seu primeiro massacre em larga escala, em 9 de novembro de 1938, no qual destruíram quase todas as sinagogas da Alemanha e assassinaram trinta e cinco judeus, os nazistas anunciaram que a perseguição era uma homenagem ao aniversário de Martim Lutero. ( p. 107).

Hitler saindo de outra Igreja luterana. A igreja é a Christus-und Garnisonkirche 
der evangelisch-lutherische Kirchengemeinde, em Wilhelmshaven, que registra em 
sua cronologia de visitantes ilustres: “Visita de Hitler à cidade e a Igreja em 1933.”
https://de.wikipedia.org/wiki/Christus-_und_Garnisonkirche_(Wilhelmshaven)


Suástica. A suástica, apropriada por Hitler como símbolo do
Terceiro Reich , também apareciam em todas as partes
da Igreja Memorial Martinho Lutero, mas foram apagadas apos o final
da Segunda Guerra, quando o uso tornou-se proibido na Alemanha.


No dia 21 de março de 1933, na cidade de Potsdam-Alemanha, teve lugar a inauguração simbólica do III Reich dentro de duas igrejas protestantes. A primeira cerimônia começou na luterana Igreja de São Nicolau, e marchou em procissão com Hitler, Goebbles e partidários nazistas até a calvinista Igreja de Garrison, onde outra cerimônia deu início ao terrível Terceiro Reich. - Fontes: Diário de Goebbels; Guerreiros de Hitler, Guido Knopp, pág 27. e  https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Garnisonkirche_Potsdam



Em 15 de novembro de 1933, mais de 1000 diaconisas luteranas e monjas se reuniram sob a suástica com o pastor protestante Johann Heinrich. O Bispo do Reich Ludwig Müller, em seu discurso, disse: "deixe-me comparar nossas irmãs com o AS." (o grupo paramilitar nazista). (Pode ser coincidência, mas a disposição das mesas da reunião, tinha uma semelhança com uma suástica gigante. À direita, Hitler dá autógrafo a uma monja luterana.

Muitos confundem as cerimônias religiosas de Hitler como tendo sido feitas em igrejas católicas devido a semelhança das indumentárias dos sacerdotes católicos copiadas pelos luteranos, isso não procede. Todas as cerimônias religiosas realizadas ou frequentadas por Hitler foram em igrejas protestantes luteranas. Foi na igreja luterana que ele casou Goering, batizou a filha de Goering, casou Goebbels e costumava fazer visitas e ser bem acolhido.

Hitler não simpatizava com a Igreja católica, e a tinha como inimiga de seus planos. Eugenio Pacelli, futuro Papa Pio XII, na posição de núncio apostólico da Baviera, entre 1917 e 1929, fez 44 discursos dos quais 40 denunciavam alguns aspectos da ideologia nazista emergente. Em carta endereçada ao bispo de Colônia, em 1935, chama os nazistas de “falsos profetas, orgulhosos como Lúcifer.”

Sua primeira encíclica como papa Pio XII, de 1939, ganhou manchete na primeira página no New York Times com o título: “Papa condena ditadores, os que violam os tratados e o racismo”. Aviões aliados lançaram milhares de cópias da encíclica em território alemão para despertar o sentimento antinazista. (Revista Isto É, N° 2144, de 10 Dez de 2010)


Este era o sonho de Hitler, sempre desejoso da benção de Lutero:

"Eu insisto na certeza de que, mais cedo ou mais tarde — uma vez que nós assumirmos o poder — o Cristianismo será superado e a igreja alemã estará sem um Papa e sem a Bíblia. E LUTERO, se ele pudesse estar conosco, NOS DARIA A SUA BÊNÇÃO."  (Adolf Hitler, por N.H. Baynes, Hitler's Speeches, Oxford, 1942, página 369).


Hitler em ambientes religiosos luteranos


Protestantes adventistas adorando Hitler


Esta corrente dentro da Igreja Protestante representava 30% dos fiéis no início dos anos 30 e a medida que crescia rapidamente terminou por eleger Hitler em 1934. Veja no mapa eleitoral da época a procedência dos votos para Hitler:



Na nave da Igreja Memorial Martinho Lutero, havia também
um busto de Hitler, similar a este, também retirado
 e substituído pelo de Lutero - conta Isolde.

A Luminária no hall de entrada, coma Cruz de Ferro das honrarias nazistas.

Sinos da Igreja, com a Cruz e a Suástica.

A decana revela ainda que era ``muito difícil`` fazer sermões na Martinho Lutero, ``porque as palavras ecoam nos símbolos à volta``.

- É penoso falar sobre dignidade humana quando o entorno evoca um sistema que não tinha o menor respeito pela vida alheia, especialmente a dos judeus. Às vezes, tenho a sensação de que os símbolos acabam tendo mais poder do que as palavras.

É nestas horas que Isolde teme que, se reaberta, a igreja possa se tornar um lugar de peregrinação para os neonazistas. Doris acredita que esta possibilidade é remota.

- Eles não são ligados à religião como eram os alemães depois da Primeira Guerra - afirma. - Num primeiro momento, houve uma crise de fé, por causa de tantas mortes sem sentido. A tática da Igreja, então, foi alinhar-se com o movimento fascista, que era popular na sociedade.

O plano final é que a Martinho Lutero seja declarada patrimônio histórico da Alemanha e passe a receber fundos federais para manutenção. Mesmo que consiga ser reformado, o templo não voltará a abrigar serviços religiosos regulares. A nave é grande demais para o tamanho da comunidade protestante de Tempelhof.

Mas os párocos pretendem abrir a igreja para ``cerimônias especiais``, como cultos em 27 de janeiro, dia da liberação do campo de concentração de Auschwitz, em 1945. Outra data que será lembrada é 9 de novembro, quando ocorreu em 1938 a onda de ataques contra propriedades de judeus na Alemanha, conhecida como ``A Noite dos Cristais``.


Para saber mais sobre todo o desfecho da paixão protestante por Adolf Hitler, acesse: http://fimdafarsa.blogspot.com.br/2013/09/o-nazismo-nasceu-do-protestantismo.html

Fontes:

Jornal do Brasil 26/03/2006;

BA Koblens R 43 11/478ª);

Instituto Umanitas Unisinos

N. Micklem, O Nacional socialismo e a Cristandade, Lisboa, 1940;

Stephen H. Roberts, The House That Hitler Built, Nova Iorque, Harper & Brothers, 1938;

 Prager e Telushkin, p. 171;

Revista Isto É, N° 2144, de 10 Dez de 2010;

N.H. Baynes, Hitler's Speeches, Oxford, 1942;

Gedenkstätte Deutscher Widerstand;